Há de chegar um dia, em que tudo
o que disse, todas as experiências que passei serão apenas contos. Muito se
perderá e não se terá certeza de quase nada. Esses contos serão passados entre
as pessoas até que virem a velha historia do “ O Amigo do Amigo do meu Amigo”.
E ninguém mais acreditará. É uma pena, pois se as pessoas dessem ouvidos as
antigas lendas urbanas, estariam protegidas e preparadas para o absurdo.
Sei disso porque nunca dei ideia
para sexta feira treze. Para mim era uma data como outra qualquer, contudo um
dia eu estava no ponto esperando o ônibus. Já havia escurecido quando uma
senhora bem velhinha e curvada, veio até a mim dizendo:
- Boa noite Senhor! O ônibus que
vai para o bairro dos palmares já passou?
Amigavelmente respondi à senhora.
-Sim já passou! Senhora.
A velinha fez uma cara de agonia,
e como alguém que está apavorada, começou a olhar para os lados. Enfiou a mão
dentro da bolsa, retirou um terço e começou a rezar. Só estávamos eu e ela no
ponto, achei curiosa a reação dela e resolvi perguntar:
- Desculpa senhora. Mas a senhora
está preocupada com alguma coisa?
- Sim meu filho, hoje é sexta feira
treze.
Não aguentei e dei uma risada espontânea,
porém me segurei para não rir mais. Pois era uma senhora de idade não cabia debochar
da crença dela.
- É meu filho pode rir. Você deve
estar pensando que a velha aqui está caducando.
- Não senhora, de jeito nenhum. Só
acho que não precisa se preocupar, o próximo ônibus já vem.
- É meu filho só que durante a
noite de sexta feira treze, os mortos podem andar entre nós. Pois por algumas
horas os portões que separam o mundo dos mortos do nosso, fica aberto.
Segurei para não rir novamente.
Só que a senhorinha estava mesmo preocupada. Dava para ver o medo no seu
semblante. Ela pendurou o terço como se fosse um colar, envolta do pescoço. E
saiu andando e dizendo.
- Eu que não vou ficar aqui parada,
vou voltar para a casa da minha patroa e dormir lá.
Após a velha sair fiquei rindo
sozinho pensando no que ela havia dito. O local aonde eu estava era afastado e
longe do centro. Quase não havia casas, a maioria era comercio e já havia fechado.
Realmente era perigoso ficar ali a esta hora, mas não por ser uma sexta feira
treze.
Foi quando um nevoeiro espesso
começou a surgir e cobriu boa parte da rua. Achei estranho, mas continuei ali
parado no ponto. Quando vi o que parecia ser dois faróis. Fiquei olhando
atentamente, e quando passou por mim notei que realmente era um ônibus. Mas
parecia estar caindo aos pedaços, e somente havia o motorista, e sua pele era
enrugada e cadavérica.
Tomei um susto, mas pensei
comigo:
- Só pode ser imaginação.
Como o ônibus passou rápido não
deu para ter certeza, mas parecia que o motorista estava morto. Comecei a ouvir
sussurros por toda parte na rua. Eram bem suaves e baixos, mas eram
horripilantes de se escutar. Imediatamente fiquei tenso, e olhei para os lados.
O nevoeiro só aumentava. Uma figura baixinha e curvada veio em meio ao
nevoeiro.
Era a senhorinha que havia
perdido o ônibus. Quando ela se aproximou, notei que estava muito pálida e com
os olhos avermelhados de sangue. No seu pescoço no lugar do terço, havia um
pedaço de corda bem apertado. Ela vinha na minha direção balbuciando palavras
sem sentido:
- Dor, Vingança, Morte!
Eu corri então o mais rápido que
pude na direção contraria, quando comecei a correr notei que a paisagem ao meu
redor estava muito estranha, as casas, prédios, lojas haviam sumido. Só restava
em volta árvores retorcidas, e o chão havia se tornado um enorme lamaçal. Parecia
que eu havia sido transportado para um pântano. Continuei correndo sem
direção. Tropecei e cai.
Levantei e percebi que havia
tropeçado em um tumulo, eu estava rodeado de túmulos. Alguns com cruzes de
madeira malfeitas, outros com lápides enormes de mármore. Fiquei desesperado e chorei como uma criança. As vozes aumentaram, e por todos os lados
havia mortos se levantando de suas covas.
Voltei a correr sem rumo,
desviando dos cadáveres apodrecidos, que vagavam na minha direção. Corri até as pernas não aguentarem mais. Meu joelhos doíam e minha barriga queimava, então me joguei ao chão e comecei a rezar e chorar.
Senti os mortos se aproximarem e começaram a tocar meu corpo. Quando uma forte
luz e um barulho estrondoso espantaram a todos. A névoa se desfez como mágica,
e eu estava de volta ao bairro. Jogado no chão no meio da rua, sujo e
desesperado.
O motorista desceu do ônibus preocupado
e me perguntou:
- O senhor está passando mal?
Desesperado olhando ao redor eu
respondi:
-Não obrigado, eu estou bem! Por
favor, me leva embora daqui! Eu tenho dinheiro me deixa pegar este ônibus, pelo
amor de Deus.
-Sim claro, se acalme pode
entrar.
Já dentro do ônibus eu ainda
estava desesperado e sem entender o que havia acontecido. Resolvi olhar as
horas. Eram meia noite e um, a sexta feira havia acabado. Olhei para o lado de
fora do ônibus enquanto ele partia. No ponto estava a velhinha que havia me falado sobre a sexta feira treze, acenando um tchau com a mão e sorrindo.
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