Algumas vezes estamos sozinhos e
sentimos uma presença próxima e de repente chamam o nosso nome. Quando viramos,
para nossa frustração continuamos sozinhos. Há quem diga que são anjos da
guarda, outros preferem dizer que é um pressagio de morte, mas a verdade é
muito mais assustadora que isso. A Poucas pessoas é revelado o real
significado, e com certeza prefeririam continuar com a imaginação. Acredite em
mim, eu sou uma destas poucas pessoas que tiveram o desprazer de descobrir a
verdade.
Estava eu conversando com meu
amigo de trabalho, éramos guardas noturnos em uma grande fábrica, e como de
costume passava a madrugada inteira acordado fazendo ronda. Falávamos
exatamente sobre o fato de por diversas vezes termos ouvido alguém nos chamar
durante a madrugada, enquanto ele contava algo sobre aparições eu insistia no
fato de serem as nossas mentes nos pregando peças devido ao cansaço. Em meio a
conversa ele me interrompeu dizendo algo que de fato seria relevante para o
desenrolar das coisas aquela noite.
- Já ouviu falar de corpo seco? –
Me perguntou um pouco preocupado, como se tentasse não ser ouvido por ninguém.
- Não. Nunca ouvi falar disso, o
que é?
E como alguém que passava um
segredo para frente, em tom baixo e pausado ele começou a falar sobre o que
seria o tal corpo seco. Não dei muita ideia no momento, entretanto escutei sem
questionar a sua descrição.
- Sabe, minha avó dizia que
quando alguém morre com muito sofrimento, a alma não faz a passagem. Ela
continua aqui tortuosa vagando entre o nosso mundo e o outro lado, e que ela
tenta achar alguém que ajude a fazer esta passagem. O corpo seco se aproveita
de pessoas que estão mentalmente fracas, muito abaladas ou com muitos
problemas.
Ouvi toda aquela conversa, mas
como já havia vivido certas experiências estranhas em minha vida, não levei
como verdade a historia, porém não ignorei. Nós revezávamos na ronda e estava
na minha vez de andar pela fábrica. O turno da noite era bem calmo, poucas
pessoas trabalhavam e na parte aonde chegavam os trens, não se via ninguém, era
o local mais crítico e volta e meia um sem teto tentava fazer um vagão de
abrigo e tínhamos que por pra fora.
Estava eu caminhando entre os
trens quando ouvi claramente uma voz de mulher me chamar pelo nome, me virei e
não vi ninguém. Achei estranho e como havia acabado de tocar neste assunto,
pensei que fosse meu amigo querendo me assustar. Segui caminhando entre os
vagões quando mais uma vez fui chamado, me virei e entre os vagões avistei
rapidamente uma figura que parecia ser uma mulher com um vestido florido.
Assustei-me e gritei pedindo que a pessoa parasse e se identificasse.
Não tive respostas, tirei meu
cassetete e corri com a lanterna ligada entre os vagões, na tentativa de
avistar algo. Havia uma pequena ponte onde passavam os trilhos da ferrovia, eu
estava exatamente sobre a ponte quando ouvi embaixo de mim o meu nome. Joguei a
lanterna e vi uma mulher com o vestido todo rasgado, coberta de lama foquei a
lanterna e cerrei meus olhos para observar melhor. Notei então que sua pele estava
seca praticamente sem musculatura, tinha um tom roxo esverdeado e um rosto
cadavérico fúnebre.
Corri o mais rápido que consegui
até a guarita, cheguei lá praticamente sem folego. Meu companheiro de turno
levantou assustado. Gritei com todas as minhas forças para que ele pegasse a
espingarda, pois haviam pessoas de baixo da ponte. Lógico que não contei o que
vi, disse que observei uma movimentação e eram muitos, por isso voltei para
pedir ajuda. Quando chegamos não havia nada. Obvio que o meu companheiro não
parou de me perturbar, dizendo que havia me assustado com galhos.
Mais tarde cheguei em casa
exausto, disposto a esquecer o episódio e me deitar, não demorou muito para o
sono vir. Em meio ao sono, inevitavelmente o rosto putrefato daquela mulher que
vi sob a ponte veio me despertar. Acordei apavorado e ensopado pelo meu suor. Não
consegui mais dormir aquele dia, sempre que me deitava a imagem dela voltava na
minha cabeça. A noite chegou e tive que trabalhar mais uma vez, mas o cansaço
era enorme e não havia conseguido pregar o olho o dia todo.
Durante o turno falei com meu
amigo que estava meio cansado, perguntei se ele podia cobrir um pouco a minha
ronda. Tentei cochilar um pouco e finalmente peguei no sono, quando fui interrompido
por uma mão que balançava meu ombro. Meio
grogue abri os olhos e vi a mulher cadavérica olhando para mim, dei um grito e
cai da cadeira. Foi quando realmente acordei e vi que não passava de um sonho.
Não podia mais conviver com aquilo, havia passado um dia inteiro sem que
conseguisse dormir, peguei a espingarda e fui em direção à ponte.
Caminhei até a ponte e desci
entrando no pequeno rio que a cortava, com a arma em punho iluminei todo o
local e nada, até que compreendi como veria a mulher de volta. Sai do riacho e
me deitei na margem, estava exausto, e não demorou muito para ela vir até o meu
encontro. Eu estava apavorado, era o cadáver de uma mulher já em decomposição saindo
de dentro do rio. Tentei me controlar e perguntar o que estava havendo. O
cadáver olhou para mim e murmurou em tom agonizante.
- Ajude-me a sair daqui! Ajude-me
a sair daqui!
Acordei aparvoado e desta vez o
cadáver não se foi, permaneceu ali me olhando parado. Tomei coragem e
perguntei:
- O que devo fazer?
- Me tira daqui! – Respondeu com
um chiado agonizante apontando para o rio.
Soltei a arma na beira do rio
entrei e comecei a tatear o fundo, foi quando achei o que parecia ser um saco
coberto pela lama do fundo do rio, e com muito esforço retirei e levei até a
beira. Quando abri o cheiro de podre se espalhou pelo ar, mas na mesma hora
tive certeza de que era ela, pelos trapos de vestido que estavam rasgados
dentro do saco junto a um cadáver.
Avisei as autoridades, foi
difícil explicar como cheguei até o corpo, mas digamos que não disse toda a
verdade. Com o passar dos dias consegui dormir, porém ela veio até mim em meus
sonhos por uma ultima vez, só que estava linda e serena, sentada sobre um
tumulo de mármore branco.
Portanto quando estiver a sós e
ouvir seu nome sendo pronunciado, pense duas vezes antes de atender ao chamado.
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